CONSIDERAÇÕES REFLEXIVAS
Os Espelhos e os Tempos.
William Contraponto
"Se você tem a idade que seu pai tinha quando você nasceu, provavelmente você já é mais sábio do que ele." A frase provoca, inquieta, mas não carrega arrogância. Ela aponta para uma realidade silenciosa: o tempo mudou, e com ele, mudou também o que significa ser sábio.
Aos trinta ou quarenta anos, nossos pais enfrentavam um mundo com menos perguntas, mas também com menos ferramentas para respondê-las. A informação era escassa, lenta, mediada por poucas fontes. O saber exigia tempo, paciência, sorte. Hoje, basta um toque, uma busca, um vídeo. Isso não transforma ninguém, por si só, em conhecedor. Mas amplia drasticamente o campo de possibilidades. O que nossos pais levavam décadas para descobrir por tentativa e erro, nós encontramos em segundos — às vezes, acompanhados de análises, críticas, múltiplas visões.
Mas há mais. Somos o acúmulo dos erros e acertos deles. A cada geração, há uma certa revisão, uma espécie de auditoria silenciosa sobre o modo de viver anterior. Herdamos suas angústias, seus medos não ditos, suas esperanças fracassadas. E também suas pequenas vitórias. Em muitos casos, quando atingimos a idade deles, já refletimos sobre tudo que eles viveram sem nomear. Somos, muitas vezes, mais analíticos. Porque tivemos tempo para pensar sobre aquilo que eles mal puderam compreender enquanto acontecia.
Nosso mundo exige outras formas de sabedoria. Não é mais preciso saber consertar um motor, mas talvez seja vital entender as engrenagens de uma mentira. Hoje, é mais útil interpretar um algoritmo ou reconhecer uma manipulação do que decorar fórmulas. A sabedoria, agora, está menos em repetir, mais em desconfiar. Menos em obedecer, mais em escutar.
Mas isso não faz de nós melhores. Faz de nós filhos de uma continuidade. Nossos pais fizeram o que podiam com o que tinham. Suaram por certezas que hoje questionamos. Protegeram-se de verdades que hoje enfrentamos. Foram valentes à sua maneira. Nós, talvez, tenhamos mais lucidez, mas também mais cansaço, mais ansiedade, mais ruído.
Se somos mais sábios, é porque herdamos a estrada já parcialmente trilhada. Porque tivemos espelhos, livros, filmes, internet, terapia, ciência, e — talvez o mais importante — tempo para olhar para dentro. Sabedoria não é só experiência, é consciência da experiência. E isso, em tempos velozes, pode surgir mais cedo.
Mas que fique claro: sabedoria não é soberba. Reconhecer esse possível avanço não é desmerecer quem veio antes. É compreender que o tempo nos empurra adiante, mesmo que a passos invisíveis. E que, se há mais luz em nós, é porque outros acenderam a tocha em meio ao escuro.