Artigo: Os Iluminados do Zap - William Contraponto


Os Iluminados do Zap

Há uma nova elite intelectual emergindo no Brasil. Eles não frequentaram universidades — que, como se sabe, são fábricas de comunistas que leem livros e questionam o mundo — mas encontraram a verdade no lugar mais puro e incontaminado pelo pensamento crítico: os grupos de WhatsApp da família.

Ali, entre figurinhas de "Bom dia com Jesus" e vídeos tremidos de pastores suando mais que vendedores de Yakult no Saara, eles se formam. São PhDs em "geopolítica de corredor de supermercado", especialistas em “marxismo cultural” e têm mestrado em “como a Terra é plana, sim senhor”.

Não se engane: a sabedoria deles não está nos livros, mas nas correntes. Cada áudio anônimo que começa com “gente, eu não posso me identificar, mas trabalho dentro do governo” é um tratado filosófico. Uma revelação. Uma epifania. O Oráculo de Delfos, perto disso, era só fofoqueiro.

E o bolsonarismo, claro, é seu templo. Afinal, quem precisa de fatos quando se tem fé? Fé na cloroquina, fé no mito, fé na ideia de que existe uma conspiração global para fazer você comer grilo e usar banheiro unissex.

Eles riem da ciência com um desprezo que só é possível para quem nunca precisou passar no vestibular. Eles zombam da cultura como se zombar fosse sinônimo de superioridade. Acreditam que Paulo Freire destruiu o Brasil e que o Leonardo DiCaprio queimou a Amazônia — tudo isso entre um churrasco e outro financiado com o auxílio que o comunismo quer tirar.

Na cabeça deles, o mundo é dividido entre os “patriotas de bem” (que por coincidência são sempre eles) e o resto: traidores, esquerdopatas, mamadores de Lei Rouanet e adoradores de picanha argentina.

E quando você tenta dialogar? Ah, você é arrogante. Elitista. Um escravo da GloboLixo. Porque quem sabe mesmo é o tio do zap, que largou tudo — inclusive o raciocínio lógico — para viver a verdade do meme.

Mas não se preocupe. O tempo, como sempre, é o maior desinfetante de delírios. Até lá, seguimos firmes, acompanhando esse espetáculo tragicômico onde o obscurantismo desfila com a empáfia de quem acha que "O Iluminismo" é uma marca de lâmpada.